Leda Gontijo prepara mostra para
comemorar 100 anos de vida
Ex-aluna de Guignard, escultora mineira tem obras de destaque à mostra em cidades brasileiras e já foi tema de documentário
Ailton Magioli - EM CulturaPublicação:22/06/2015 09:02Atualização: 22/06/2015 13:28
Aos 100 anos, completados em março, Leda Gontijo é uma verdadeira fonte de energia, sabedoria e sensibilidade, sem dispensar a fina – e necessária – ironia que costuma permear os bons papos. Escultora, ceramista e pintora, ela foi aluna de Alberto da Veiga Guignard (1896-1962) quando o mestre abriu sua famosa escolinha no Parque Municipal, em BH, na década de 1940. Agora, a artista prepara uma retrospectiva para comemorar o centenário, sob curadoria de Paulo Rossi. A Galeria do Minas Tênis Clube 1 será o provável espaço da mostra.
Esculturas da mineira Leda enfeitam vários jardins. No mausoléu da AcademiaBrasileira de Letras, no cemitério carioca de São João Batista, chamam a atenção Santo Agostinho e São Tomás de Aquino em tamanho natural, esculpidos por ela em pedra-sabão. Por obra da neta, Daniela Gontijo, a artista inspirou o documentário 'Leda de arte Leda', selecionado para o Festival do Rio, em 2007, e lançado em DVD pela Som Livre. A partir do depoimento do ilustrador e chargista Ziraldo, o filme mostra de forma leve e divertida a obra e a personalidade incomparável de Leda Selmi Dei Gontijo.
Nascida em 12 de março de 1915, em Juizde Fora, aos 3 anos Leda deixou a Zona da Mata mineira para fazer um “tour” pelo Brasil. O pai, de origem italiana, trabalhava na construção de açudes e estradas de ferro – a família morou em várias cidades do Nordeste e de São Paulo antes de chegar a Belo Horizonte, em 1929. No terreno de 8 mil metros quadrados em Lagoa Santa, onde mora e mantém o ateliê Mi Ranchito, a artista cultiva duas hortas e o pomar com mais de 40 espécies de frutas, entre as quais destaca-se o sapoti, cujo processo de amadurecimento gosta de comparar às mocinhas so século 21. “Você abre a gaveta e aperta pra ver se está maduro”, diverte-se Leda, comentando que as meninas de hoje “ganham apertos de tudo quanto é lado”.
A exemplo da mãe, pintora acadêmica, Leda Gontijo decidiu explorar seus dotes artísticos desde a infância. “Meu sonho era estudar escultura, mas como não havia ninguém que ensinasse a técnica na Belo Horizonte da década de 1940, fui aprender pintura com Guignard. Ele me achava um talento, mas pintura não era o que queria”, revela. O mestre – “encantador, educado e fino” – chegou a morar com os Gontijos na Rua Caraça, no Bairro da Serra, para pintar o teto da casa da família. “Hoje, aquelas pinturas de paisagens mineiras inspiradas no estilo alemão da Baviera, origem da família dele, estão preservadas no salão de recepção do prédio, batizado Alberto da Veiga Guignard”, informa.
Na parede da sala de sua ampla casa, em Lagoa Santa, Leda preserva seu retrato inacabado, feito pelo mestre em 1956. “Guignard tinha mania de começar uma pintura e não terminá-la. Deixava de lado”, recorda, contando que o senador e banqueiro Magalhães Pinto gostava de dizer que ela ficou “com cara de preceptora alemã” naquele quadro.
Leda optou pela escultura e a cerâmica, mas sua obra mantém a influência de Guignard. Especialmente em quadros como o que traz meninos soltando pipa, pintado por ela em Guarapari (ES), onde morou. Superativa, poucos dias antes de viajar para a nova casa de praia da família, em Nova Viçosa (BA), a artista recebeu a reportagem em Lagoa Santa. Falante e simpática, revelou que os médicos se mostram surpresos diante de sua “memória fantástica”, produto da vida saudável que leva. “Remédio, só tomo para pressão, já que a família sempre teve problemas de hipertensão”, revela Leda, que lê sem óculos. Com seis filhos, 25 netos e 24 bisnetos, ela avisa: “Ainda como de tudo e sou louca por sorvete”.
HIP-HOP O lazer da artista, além de ler, é ouvir música – clássica, de preferência. “Beethoven, Chopin e Liszt”, lista, dizendo detestar “a música tá batendo na lata, esse tal de hip-hop”. Mas ela admira os Beatles, “que fizeram canções lindas”. Na TV, só noticiário. Leda não tem paciência para novelas, à exceção das tramas de época. E faz questão de elogiar Pantanal, saga que Benedito Rui Barbosa escreveu para a extinta TV Manchete. “Foi linda”, resume.
Escultora e ceramista autodidata, Leda conta que foi a primeira professora de cerâmica em BH. Atualmente, dedica-se a esculpir peças para decoração. “Estou terminando uma pera para jardim. Quero fazer um minipomar só de esculturas”, diz. Já tem pronta a maçã, que, aliás, enfeita seu próprio pomar. “Quero fazer a carambola e o caju”, anuncia, exibindo frutas exóticas como o mangustão-amarelo, cuja muda trouxe da Índia. Eclética, além das esculturas – uma das últimas é O abraço, a partir de um tronco de madeira de lei –, trabalha com bronze e pedra. “Em pedra costuma demorar dois meses, já em bronze faço em dois dias.”
A ausência de suas peças em espaços públicos de BH é motivo de mágoa. “Em 1969, fiz O astronauta, em fibra de vidro, e doei para a prefeitura. Quebraram a escultura, que sumiu”, lamenta Leda. Quando ouvia perguntas sobre o motivo dessa obra, respondia: “Estava em órbita”. Posteriormente, esculpiu meninos jogando bola na Praça do Papa, peça também destruída.
A artista conta que, em Lagoa Santa, há oito esculturas de São Francisco feitas por ela em marmorite, além de várias peças espalhadas por residências. Leda tem uma legião de amigos por lá. Quando completou 100 anos, ganhou de presente uma colcha de retalhos com bordados criados por cada uma de suas amigas. “Não é linda?”, diz, orgulhosa, ao exibir a peça. Com intensa vida social, ela apoiou a restauração da histórica capela de Nossa Senhora do Rosário, no Centro da cidade.
Em seu ateliê, destacam-se as esculturas em madeira e pedra. Para homenagear Aleijadinho, Leda transformou um tronco de pequi em bela peça – cada anjo barroco representa um dos netos. “Gastei dois meses só pra limpar a terra e o formigueiro na madeira”, revela. A enorme peça, avaliada em R$ 200 mil, segundo ela, levou um ano para ficar pronta. O preço, confessa, varia de acordo com o grau da amizade. O sobrinho, por exemplo, pagou R$ 5 mil por um trabalho. “Não paga nem o material”, revela Leda, toda feliz e sorridente.
Leda Gontijo leva dois meses para concluir suas esculturas em pedra
Na parede da sala de sua ampla casa, em Lagoa Santa, Leda preserva seu retrato inacabado, feito pelo mestre em 1956. “Guignard tinha mania de começar uma pintura e não terminá-la. Deixava de lado”, recorda, contando que o senador e banqueiro Magalhães Pinto gostava de dizer que ela ficou “com cara de preceptora alemã” naquele quadro.
Leda optou pela escultura e a cerâmica, mas sua obra mantém a influência de Guignard. Especialmente em quadros como o que traz meninos soltando pipa, pintado por ela em Guarapari (ES), onde morou. Superativa, poucos dias antes de viajar para a nova casa de praia da família, em Nova Viçosa (BA), a artista recebeu a reportagem em Lagoa Santa. Falante e simpática, revelou que os médicos se mostram surpresos diante de sua “memória fantástica”, produto da vida saudável que leva. “Remédio, só tomo para pressão, já que a família sempre teve problemas de hipertensão”, revela Leda, que lê sem óculos. Com seis filhos, 25 netos e 24 bisnetos, ela avisa: “Ainda como de tudo e sou louca por sorvete”.
HIP-HOP O lazer da artista, além de ler, é ouvir música – clássica, de preferência. “Beethoven, Chopin e Liszt”, lista, dizendo detestar “a música tá batendo na lata, esse tal de hip-hop”. Mas ela admira os Beatles, “que fizeram canções lindas”. Na TV, só noticiário. Leda não tem paciência para novelas, à exceção das tramas de época. E faz questão de elogiar Pantanal, saga que Benedito Rui Barbosa escreveu para a extinta TV Manchete. “Foi linda”, resume.
Escultora e ceramista autodidata, Leda conta que foi a primeira professora de cerâmica em BH. Atualmente, dedica-se a esculpir peças para decoração. “Estou terminando uma pera para jardim. Quero fazer um minipomar só de esculturas”, diz. Já tem pronta a maçã, que, aliás, enfeita seu próprio pomar. “Quero fazer a carambola e o caju”, anuncia, exibindo frutas exóticas como o mangustão-amarelo, cuja muda trouxe da Índia. Eclética, além das esculturas – uma das últimas é O abraço, a partir de um tronco de madeira de lei –, trabalha com bronze e pedra. “Em pedra costuma demorar dois meses, já em bronze faço em dois dias.”
A ausência de suas peças em espaços públicos de BH é motivo de mágoa. “Em 1969, fiz O astronauta, em fibra de vidro, e doei para a prefeitura. Quebraram a escultura, que sumiu”, lamenta Leda. Quando ouvia perguntas sobre o motivo dessa obra, respondia: “Estava em órbita”. Posteriormente, esculpiu meninos jogando bola na Praça do Papa, peça também destruída.
A artista conta que, em Lagoa Santa, há oito esculturas de São Francisco feitas por ela em marmorite, além de várias peças espalhadas por residências. Leda tem uma legião de amigos por lá. Quando completou 100 anos, ganhou de presente uma colcha de retalhos com bordados criados por cada uma de suas amigas. “Não é linda?”, diz, orgulhosa, ao exibir a peça. Com intensa vida social, ela apoiou a restauração da histórica capela de Nossa Senhora do Rosário, no Centro da cidade.
Em seu ateliê, destacam-se as esculturas em madeira e pedra. Para homenagear Aleijadinho, Leda transformou um tronco de pequi em bela peça – cada anjo barroco representa um dos netos. “Gastei dois meses só pra limpar a terra e o formigueiro na madeira”, revela. A enorme peça, avaliada em R$ 200 mil, segundo ela, levou um ano para ficar pronta. O preço, confessa, varia de acordo com o grau da amizade. O sobrinho, por exemplo, pagou R$ 5 mil por um trabalho. “Não paga nem o material”, revela Leda, toda feliz e sorridente.
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